Manuel Bandeira

Manuel Bandeira e o lirismo por excelência
Manuel Bandeira e o lirismo por excelência

Manuel Bandeira foi um poeta modernista, sem dúvida. No entanto, afirmar que ele se entregou de todo a tal estilo, tal como fizeram Oswald de Andrade e Mário de Andrade, seria audacioso. Digamos que ele tinha seu próprio estilo, mostrando-se despreocupado em cultuar esta ou aquela tendência – razão pela qual optou por exercer sua habilidade artística de acordo com o espírito com que “denunciava” suas emoções no momento em que escrevia. Prova disso é que sua obra se demarca por três vertentes: a fase pós-simbolista, a modernista e a pós-modernista.  


Nessa primeira fase, pós-simbolista, o poeta se mostra como alguém ainda “preso” aos pressupostos manifestados pela era simbolista, sobretudo pelo espírito decadentista. Traços esses atestados por meio de uma das suas criações, expressa a seguir:

DesencantoEu faço versos como quem chora
De desalento. . . de desencanto. . .
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.


Meu verso é sangue. Volúpia ardente. . .
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.


Constatamos que há uma preocupação em manter um certo  formalismo, principalmente em se tratando das rimas (chora-agora/desencanto-pranto), bem como no que diz respeito à própria estrutura, por se tratar de um soneto. Outro aspecto que se torna evidente é a presença da sinestesia, uma marca predominante no Simbolismo, manifestada pelos traços dualísticos entre “amargo x quente”. Não raro ocorre com o sentimento manifestado nas palavras do artista, carregadas de um pungente existencialismo, por meio das expressões “angústia rouca e acre sabor na boca”.

Na segunda fase, na qual podemos constatar traços modernistas, o poeta deixou se revelar pela simplicidade impressa na escolha das palavras, traço esse revelado por alguém que capta fatos fugazes, banais do cotidiano. Outro aspecto faz referência ao desapego quanto ao formalismo, demarcado pelas criações impregnadas de versos livres e brancos. Características evidenciadas abaixo:

Momento num café

Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos voltados para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.
Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta

Temas como infância, amor, doença e morte são recorrentes nas criações de Manuel Bandeira. Quanto à morte, por exemplo, ele se mostra indiferente, ou seja, abnega-se de um sentimento de autopiedade, faz uso do humor e da crítica para justamente camuflar realidades existenciais, características perfeitamente constatáveis em:

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Consoada

Quando a Indesejada das gentes chegar
(Não sei se dura ou caroável),
Talvez eu tenha medo.
Talvez sorria, ou diga:
- Alô, iniludível!
O meu dia foi bom, pode a noite descer.
(A noite com seus sortilégios.)
Encontrará lavrado o campo, a casa limpa,
A mesa posta,
Com cada coisa em seu lugar.


Por último, houve a fase pós-modernista, na qual o poeta pendeu para o culto de versos tradicionais, rimados, livres e brancos, além de algumas formas populares, como o rondó – poema constituído de apenas duas rimas e formado de três estrofes, totalizando quinze versos. De forma a representar tais características, atentemo-nos a um exemplo abaixo:

Canto de Natal

O nosso menino
Nasceu em Belém.
Nasceu tão-somente
Para querer bem.

Nasceu sobre as palhas
O nosso menino.
Mas a mãe sabia
Que ele era divino.

Vem para sofrer
A morte na cruz,
O nosso menino.
Seu nome é Jesus.

Por nós ele aceita
O humano destino:
Louvemos a glória
De Jesus menino.

Depois de conhecer toda ideologia tão marcante na obra de Manuel Bandeira, eis um propício momento para você ficar a par da vida desse nobre representante, cujas informações se encontram abaixo elucidadas:

Manuel Carneiro de Souza Bandeira nasceu em 1886, em Recife. No ano de 1890, a família dele se transferiu para Petrópolis. Já com seis anos de idade retornou a Recife, onde lá permaneceu até os dez anos. De volta ao Rio de Janeiro, cursou o ginásio no Colégio Pedro II.

Aos 16 anos partiu para São Paulo, no intuito de cursar a faculdade de Arquitetura na Escola Politécnica, época em que contraiu tuberculose e teve de interromper seus estudos. Novamente de volta ao Rio, procurou lugares mais amenos nos quais pudesse encontrar um clima mais propício à cura de sua doença. Em 1913, mudou-se para a Suíça, internando-se no Sanatório de Clavadel, onde permaneceu por dezesseis meses.

Em 1917 publicou sua primeira obra, “Cinza das horas”, surgindo a segunda logo depois, “Carnaval” – época essa em que o poeta começou a manter relacionamento com o grupo de artistas da Semana de Arte Moderna. Falando em tal evento, é bom que se diga que Bandeira não teve participação, apenas seu poema “Os sapos” foi lido por Ronald de Carvalho. Em 1920, mudou-se para a Rua do Curvelo em São Paulo, onde lá viveu treze anos. Faleceu em 1968, na cidade do Rio de Janeiro.

Por: Vânia Maria do Nascimento Duarte

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