José J. Veiga

José J. Veiga, importante escritor goiano que transpôs as fronteiras do estado, é considerado hoje um dos grandes mestres do conto brasileiro. Suas narrativas, cuja ambientação predominante é o meio interiorano e rural de Goiás, ensejam reflexões que transcendem o espaço local e atingem patamares universais, uma vez que as temáticas abordadas pelo autor dizem da condição humana, como o medo do novo, a memória da infância e a linha tênue entre sonho e realidade.

Um dos mais significativos representantes do realismo mágico no Brasil, José J. Veiga, com uma engenhosidade ímpar, intercala a realidade e a fantasia de tal forma que o leitor mal distingue o que é representação do real e o que é expressão do fantástico, o que faz de sua literatura uma viagem fascinante.

Leia também: Murilo Rubião – outro grande nome do realismo mágico brasileiro

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Biografia de José J. Veiga

José Jacinto da Veiga, ou simplesmente José J. Veiga, foi um romancista, contista, jornalista e tradutor que nasceu no dia 2 de fevereiro de 1915, na cidade de Corumbá de Goiás.

Órfão de mãe aos 10 anos de idade, José J. Veiga passou seus primeiros anos da infância na zona rural, na fazenda de seus tios. Após um tempo vivendo com eles, foi morar com outros parentes, a família Costa Campos. Incentivado por ela, mudou-se para Goiás, então capital do estado, com o objetivo de estudar. Assim, ingressou no liceu local, onde estudou inglês e francês, vindo a concluir, portanto, a primeira fase de sua formação escolar.

Posteriormente, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou na Faculdade Nacional de Direito. Após sua formatura, em 1943, trabalhou como comentarista na BBC de Londres, cidade para onde se mudou em 1945. De volta ao Brasil, também atuou como jornalista em importantes meios de comunicação, como no jornal O Globo e na Tribuna da Imprensa. Quando tinha 44 anos, estreou no meio literário com o livro de contos Os cavalinhos de Platiplanto, publicado em 1959.

Seus livros, os quais apresentam características da chamada vertente do realismo mágico, foram traduzidos para diversos idiomas. Pelo conjunto de sua obra, José J. Veiga ganhou o importante Prêmio Machado de Assis, entregue pela Academia Brasileira de Letras. Sua morte ocorreu no dia 19 de setembro de 1999, na cidade do Rio de Janeiro.

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Características da obra de José J. Veiga

  • Presença de características ligadas ao realismo mágico, como a ocorrência de fenômenos não explicados pela lógica racional.

  • Reflexão sobre os impactos negativos da industrialização e da modernização no meio interiorano e rural.

  • Uso recorrente de recursos expressivos, como a metáfora e a alegoria.

  • Ambientação predominante no meio rural ou em cidades do interior.

Obras de José J. Veiga

  • Os cavalinhos de Platiplanto (1959)

  • A hora dos ruminantes (1966)

  • A estranha máquina extraviada (1967)

  • Sombras de reis barbudos (1972)

  • Os pecados da tribo (1976)

  • O Professor Burrim e as quatro calamidades (1978)

  • De jogos e festas (1980)

  • Aquele mundo de Vasabarros (1981)

  • Torvelinho dia e noite (1985)

  • O trono no morro (1988)

  • A casca da serpente (1989)

  • Os melhores contos de J. J. Veiga (1989)

  • O Almanach de Piumhy - restaurado por José J. Veiga (1989)

  • O risonho cavalo do príncipe (1993)

  • O relógio Belizário (1995)

  • Tajá e sua gente (1997)

  • Objetos turbulentos (1997)

  • O galo impertinente (1997)

Veja também: Marina Colasanti – contista brasileira diversas vezes premiada

A usina atrás do morro”

O conto “A usina atrás do morro” foi publicado originalmente no livro Os cavalinhos de platiplanto, em 1959. Leia um fragmento dessa narrativa que apresenta traços do realismo mágico:

Lembro-me quando eles chegaram. Vieram no caminhão de Geraldo Magela, trouxeram uma infinidade de caixotes, malas, instrumentos, fogareiros e lampiões, e se hospedaram na pensão de d. Elisa. Os volumes ficaram muito tempo no corredor, cobertos com uma lona verde, empatando a passagem.

De manhãzinha saíam os dois, ela de culote e botas e camisa com abotoadura nos punhos, só se via que era mulher por causa do cabelo comprido aparecendo por debaixo do chapéu; ele também de botas e blusa cáqui de soldado, levava uma carabina e uma caixa de madeira com alça, que revezavam no transporte. Passavam o dia inteiro fora e voltavam à tardinha, às vezes já com o escuro. Na pensão, depois do jantar, mandavam buscar cerveja e trancavam-se no quarto até altas horas. Dona Elisa olhou pelo buraco da fechadura e disse que eles ficavam bebendo, rabiscando papel e discutindo numa língua que ninguém entendia. [...]

Sem dúvida o perigo que receávamos nesses primeiros tempos era mais imaginário do que real. Não conhecendo os planos daquela gente, e não podendo estabelecer relações com eles, era natural que desconfiássemos de suas intenções e víssemos em sua simples presença uma ameaça à nossa tranquilidade. Às vezes eu mesmo procurava explicar a conduta deles como esquisitice de estrangeiros, e lembrava-me de um alemão que apareceu na fazenda de meu avô de mochila nas costas, chapéu de palha e botina cravejada. Pediu pouso e foi ficando, passava o tempo apanhando borboletas para espetar num livro, perguntava nomes de plantas e fazia desenhos delas num caderno. Muito tempo depois meu avô recebeu carta dele e ficou sabendo que era um sábio famoso. Não podiam esses de agora ser sábios também? Talvez estivéssemos fantasiando e vendo perigo onde só havia inocência.

(Fragmento do conto “A usina atrás do morro”)

Nesse fragmento do conto “A usina atrás do morro”, o narrador em primeira pessoa, morador de uma cidade do interior, expõe o espanto de seus conterrâneos quando um grupo de fora chega à cidade a fim de empreender a construção de uma misteriosa usina. Curiosos, os habitantes tentam de todas as formas descobrir que obra é essa a ser construída atrás do morro.

Esse conto, cujo enredo expressa características da vertente literária do realismo fantástico, expressa uma reflexão sobre os impactos da modernidade e da industrialização no interior do país, provocando, muitas vezes, mais prejuízos que benefícios à população local.

Edição da Companhias das Letras de “Os cavalinhos de Platiplanto”, primeiro livro de José J. Veiga. [1]
Edição da Companhias das Letras de “Os cavalinhos de Platiplanto”, primeiro livro de José J. Veiga. [1]

Frases de José J. Veiga

  • “Fiquei velho olhando para o espelho.”

  • “O passado já estava vencido, bem ou mal.”

  • “Quando uma pessoa atravessa a linha, morre de um lado, mas nasce de outro.”

  • “A felicidade tem mais essa vantagem de deixar a pessoa ser ela mesma, não mudar diante de estranhos.”

  • “Escrever um livro é procurar traduzir em palavras aquilo que a mente sonhou.”

  • “A palavra, que é a matéria do livro, não tem a leveza do sonho.”

  • “Escrevo para conhecer melhor o mundo e as pessoas.”

Crédito da imagem

[1] Companhia das Letras (reprodução)

Por: Leandro Guimarães

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