Ao falarmos de direitos humanos, somos comumente confrontados com certas ideias fabricadas acerca da legitimidade desse importante marco da história humana. O senso comum no Brasil geralmente atribui o assunto à impunidade, à injustiça e ao abrandamento de punições para criminosos. Essas atribuições são, no entanto, um grave engano que devemos nos dedicar a corrigir se nosso objetivo é a construção de uma sociedade inclusiva e justa, já que as leis que asseguram nossa liberdade de ir e vir, de pensar, de propriedade, educação, saúde e bem-estar fazem parte dos direitos humanos.
História dos tratados sobre direitos humanos
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi construída de forma conjunta. Ela contou com a participação de 56 países e foi adotada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948 como o documento que estabelece os direitos básicos inalienáveis de todos os seres humanos. Apesar de não possuir caráter legalmente obrigatório, a declaração passou a ser o ponto de referência para a construção de leis nos países que se identificam como democracias legitimadas e ainda serviu como base para outros dois documentos que possuem caráter legal: O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, que trata da garantia de acesso à justiça e à participação política, e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que estabelece a garantia de direitos econômicos, sociais e culturais de pessoas físicas que constituem a população de um país-membro da ONU.
No entanto, a história de conjuntos de leis ou acordos que garantem direitos básicos aos indivíduos é muito mais antiga que a declaração firmada em 1948. Já em 1689, a Declaração Inglesa de Direitos, documento que estabelecia nova governança no império inglês após o evento chamado de Revolução Gloriosa, tratava de assegurar direitos básicos aos cidadãos ingleses, como a liberdade, a justiça e a propriedade. Já em 1789, com a Revolução Francesa, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão definia um conjunto de direitos que deveriam ser assegurados a todos os seres humanos. Esses direitos eram entendidos como naturais e universais, aplicados a todos e em qualquer período de tempo. Entre as garantias definidas nesse documento estavam a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão, assim como uma das noções que fundamentam o Direito Internacional: “Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas...” e, ainda, “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.”
A construção da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Foi diante do cenário de enorme destruição e das memórias recentes das atrocidades da Segunda Guerra Mundial que o documento que estabelece os fundamentos dos direitos humanos universais foi criado. O longo período de guerra generalizada instituiu a insegurança e banalizou a morte, o sofrimento e a vida diante das mais de 50 milhões de vidas tomadas entre batalhas e bombardeios às cidades. A guerra tomou uma nova direção, e o campo de batalha estava em todo lugar. A crueldade testemunhada nesse período serviu para sensibilizar as nações diante do sofrimento humano. A criação da Organização das Nações Unidas teve o propósito de evitar que as atrocidades testemunhadas durante a guerra jamais voltassem a ocorrer.
Um comitê formado por oito países foi instituído em 1947 com o objetivo de discutir um esboço inicial do documento. O comitê era presidido por Eleanor Roosevelt – viúva do ex-presidente Franklin D. Roosevelt e grande defensora dos direitos humanos – e tinha participação do francês René Cassin, que foi responsável pelo primeiro rascunho da declaração, John Peters Humphrey, principal responsável pela redação do documento, e outras autoridades de diversos países. O primeiro rascunho da Declaração dos Direitos Humanos foi apresentado em 1948 e redigido com o esforço de mais de 50 países. Após dois anos, o documento final foi terminado e entregue à comunidade internacional.
Hoje a declaração dos direitos humanos é um dos documentos mais importantes que possuímos. As discussões acerca da legitimidade de organizações que defendem e monitoram o cumprimento dessas leis fundamentais estão em voga em nossa sociedade. Quais seriam os efeitos em nosso cotidiano se deixássemos de contar com os direitos previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos?