De volta ao contexto social que tanto demarcou a época em questão, deparamo-nos com a segunda metade do século XIX, sobretudo com o advento da Revolução Industrial. Com ela, emergiram novas formas de organização da sociedade, já não mais havia lugar para a aristocracia, pois em seu lugar ecoavam novos gritos, novos rumores: era a vez da classe burguesa. Como consequência desse fato, era inegável um crescimento demográfico, como também o surgimento do capitalismo, em decorrência do avanço técnico e científico.
Somadas a esses pressupostos, efervesciam também as doutrinas filosóficas e científicas, abrindo caminhos inusitados para a sociedade. Entre elas podemos destacar o Positivismo, de Augusto Comte, o Evolucionismo, de Charles Darwin, o Determinismo, de Hipólito Taine e o Marxismo, de Karl Marx. Assim, temos que, respectivamente, o Positivismo pregava que a verdade somente advém do experimentalismo, da pura observação dos fatos e constatação desses; o Evolucionismo pautava-se pelo critério de seleção das espécies, nas quais os organismos mais fracos eram eliminados, cedendo lugar aos indivíduos mais fortes e mais aptos; o Determinismo defendia que o homem era determinado pela raça, pelo contexto histórico (momento) e pelo ambiente em que vive; e, por último, temos o Marxismo, que acreditava na socialização como forma de acabar com a sociedade capitalista.
Frente a essa realidade, o que antes se explicava por meio de um instinto irracional, metafísico, subjetivo, agora era compreendido com base na razão, mediante uma observação lógica dos fatos. Desse modo, como a percepção se materializava de fora para dentro, era inegável a influência que a sociedade exercia sobre o comportamento humano, determinando sua conduta, seu modo de agir. Assim, os personagens ficcionais eram revelados como tal, demonstrando serem bondosos, corajosos, covardes, maldosos, entre outros posicionamentos. Com isso, observa-se que o lado psicológico, aos poucos, deixou de ser algo prioritário.
Elencadas as presentes elucidações, partamos agora para conhecer melhor acerca de algumas características que nortearam o estilo em questão, uma vez que assim compreendidas, abrem-nos horizontes para “descortinarmos” alguns dos discursos que se fizeram presentes na maioria das obras que representaram tal estilo. Estas características, por sua vez, foram demarcadas por alguns traços fundamentais. Entre eles, citamos:
* Objetividade – Digamos que ela foi o elemento preponderante na estética então em voga, funcionando como uma espécie de repúdio ao sentimentalismo exacerbado dos românticos. De acordo com essa concepção, os fatos deveriam ser observados com total precisão para, posteriormente, serem representados.
* Racionalismo – Como antes mencionado, toda a explicação para os fenômenos sociais tem suas raízes na ciência, ora pautada pela razão.
* Materialismo – Em se tratando dos fatos psicológicos, até mesmo eles submetem-se às leis naturais e são considerados manifestações materiais. Dessa forma, busca-se a verdade na realidade material, e não na capacidade imaginativa do ser humano, muito menos em seus sentimentos.
* Contemporaneidade – O que interessa é o momento presente, o agora. Não mais existe espaço para o saudosismo, para a exaltação das raízes históricas, tal qual na estética romântica.
Como marco introdutório do Realismo, citamos a magnífica obra de Gustave Flaubert, Madame Bovary, publicada em 1857, na França. O autor, usufruindo de sua magistral habilidade artística, criou uma personagem, Ema Bovary que, vivendo em meio a um casamento que lhe rendeu frustrações, acabou conhecendo outra pessoa e por ela apaixonando-se. Contudo, no final, morreu sozinha e infeliz por não saber enfrentar a própria realidade. Sem mais delongas, o fato é que o autor se propôs a revelar de forma contundente o perfil dos personagens burgueses de então, considerado algo inovador para aquela época, pois até então a união amorosa superava todos os obstáculos em função dos valores pregados pela própria burguesia, como por exemplo, o matrimônio, a religião, a pureza, fidelidade e nobreza de caráter por parte da heroína.