Congada

A congada é uma manifestação simbólica, cultural e religiosa que surgiu no continente africano e que sofreu influências católicas no Brasil.

Pessoas vestidas com camisa verde e calça preta e utilizando acessórios coloridos em congada realizada no estado de Goiás.
A congada é uma manifestação cultural caracterizada pela mistura de aspectos de religiões de origem africana e católica. [1]

A congada é uma manifestação cultural e religiosa de origem africana com influências do catolicismo, sendo conhecida também como congado ou congo. O ritual é marcado pela representação de cortejos reais em memória a reis negros, como também pelo culto a santos católicos, tais como a Nossa Senhora do Rosário, São Benedito e Santa Efigênia. Dança, música, espiritualidade e teatro são características essenciais da tradição da congada, trazida e difundida no Brasil pelos negros do antigo Reino do Kôngo que foram trazidos para o país para serem escravizados.

Leia também: O lento processo da abolição da escravidão no Brasil

Tópicos deste artigo

Resumo sobre congada

  • A congada é uma manifestação simbólica, cultural e religiosa que surgiu no continente africano.

  • Sua tradição foi disseminada aqui por meio dos negros escravizados que, antes, habitavam a região do Reino Kôngo.

  • O sincretismo religioso é uma característica marcante da congada, que reúne aspectos de religiões de matriz africana e do catolicismo.

  • Os primeiros registros históricos das congadas no território brasileiro foram feitos entre 1711 e 1760.

  • Nossa Senhora do Rosário e São Benedito são algumas santidades que tradicionalmente são cultuadas no ritual da congada.

  • A dança, a vestimenta e a música são aspectos marcantes nessa manifestação.

O que é a congada?

A congada é uma expressão cultural e religiosa que surgiu na África, mais precisamente nos territórios do Congo e Angola, e que foi disseminada no Brasil desde o período colonial. A palavra congada é originada do termo congo, que quer dizer “congar”, “dançar”.

Além da coroação de reis negros, o ritual cultua santos católicos, como a Nossa Senhora do Rosário e São Benedito. Esse envolvimento entre relações culturais de matriz africana com aspectos do catolicismo é característica marcante da congada.

A prática foi recriada no Brasil por meio de narrativas que mencionam o aparecimento de santidades aos escravizados. Esses santos apareceram em locais diversos, como matas, rios e grutas. Entre esses casos, estão a história da Nossa Senhora da Penha, em Pilar, no interior do estado de Goiás, e a da própria Nossa Senhora do Rosário.

Pessoas caracterizadas com acessórios e instrumentos coloridos em congada realizada em São Paulo.
Congada realizada próximo à Igreja do Rosário, na Penha, em São Paulo. [2]

O mito considerado fundador da congada no território brasileiro é o de Nossa Senhora do Rosário. A santa teria aparecido na água, no contexto da escravidão. Nessa ocasião, pessoas brancas teriam tentado tirar a imagem da água, mas não conseguiram. Apenas os escravizados mais velhos é que a resgataram.

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Características da congada

A tradição da congada é marcada pela encenação da realeza do Congo. Entre os elementos que fazem parte da manifestação, estão: a procissão, o levantamento de bandeira, as fardas, as espadas, a coroação, a dança, a música, e os tambores e chocalhos.

Pintura de Jean Baptiste Debret com a representação de reis e rainhas da congada.
A pintura de Jean Baptiste Debret retrata o momento de coleta de contribuições durante a congada.

Na congada, há categorias de participantes, por exemplo, as pessoas que dançam são conhecidas como guardas na tradição de Belo Horizonte. Esses personagens utilizam vestes diversas, e os ritmos aderidos estão relacionados com a linhagem.

Confira as funções de algumas guardas da congada:

  • Guardas de Marujo: são responsáveis por abrir o caminho para que o restante das pessoas sigam a caminhada. Ficam à frente do cortejo e são caracterizadas pelos passos e batidas rápidos.

  • Guardas de Congo: vêm logo atrás das guardas de Marujo, nelas, os tambores são maiores e o som é mais grave.

  • Guardas de Moçambique: guardam as coroas, ou seja, acompanham os reis e rainhas representados na congada. Caminham atrás das outras guardas com passos regulares e com o uso de três instrumentos (tambor, patangome e gunga).

Os responsáveis pela organização de cada edição da congada são os festeiros. A coroação marca a escolha dos festeiros da próxima congada. A manifestação é dividida em: congada de cima e congada de baixo.

Entre os personagens da congada de cima, estão:

  • rei;

  • rainha;

  • cacique;

  • príncipes;

  • crianças chamadas de conguinhos;

  • fidalgos.

Os personagens da congada de baixo são:

  • embaixador;

  • secretário;

  • guerreiros;

  • cortejo.

São instrumentos da congada:

  • cuíca;

  • pandeiro;

  • cavaquinho;

  • viola;

  • tarol;

  • tamborim;

  • ganzá;

  • reco-reco;

  • caixa;

  • rebeca;

  • violino;

  • acordeon;

  • sanfona.

Congada no Brasil

A congada é celebrada em todas as regiões brasileiras. Historicamente, em alguns estados, nos quais a expressão se iniciou, a manifestação é mais tradicional, como é o caso de Minas Gerais, Pernambuco e Goiás.

Os festejos acontecem principalmente nos meses de maio e outubro. A celebração que acontece em outubro, por exemplo, é em referência à Nossa Senhora do Rosário.

Veja também: História do Carnaval — uma das principais manifestações culturais do Brasil

Origem da congada

A origem da congada está associada à coroação de reis africanos na antiga região do Reino do Kôngo, que hoje compreende porções do Congo, de Angola e do oeste da República Democrática do Congo. O reino foi formado pelos povos bantos, e a etnia mais predominante era a bakôngo.

Por volta dos anos 1482 e 1483, o português Diogo Cão chegou à nascente do Rio Kôngo. Nesse primeiro contato, o português capturou quatro homens e os levou a Portugal, na intenção de ensinar-lhes a língua portuguesa. Após algum tempo, eles retornaram para o Reino do Kôngo. O objetivo era explorar aquelas terras para fins comerciais.

O retorno dos portugueses com os congoleses que haviam sido capturados foi visto como uma forma simbólica pelos habitantes da região. Nos anos seguintes, estabeleceram-se relações de conflito entre portugueses e congoleses diante do processo de invasão europeia naquelas terras.

Em 1641, a região de M’banza Kôngo passou a ser chamada de São Salvador devido à conversão dos reis congoleses ao cristianismo. A espiritualidade e a religiosidade dos bakôngos foram relacionadas a aspectos do catolicismo por parte da nobreza.

Alguns pesquisadores apontam que a conversão de uma elite congolesa ao cristianismo ocorreu por uma má compreensão. Eles indicam que os portugueses tinham o objetivo de ampliar o domínio econômico e religioso, bem como aumentar o tráfico de escravizados.

Já os congoleses acreditavam nas relações diplomáticas com Portugal, diante do respeito e confiança que tinham passado. Os congoleses, de acordo com pesquisadores, acreditavam que os portugueses tinham sido enviados das “terras dos mortos”.

Mapa representando o Reino do Kôngo, onde surgiu a congada, com a localização de diferentes grupos étnicos.
Mapa representando o Reino do Kôngo, com a localização de diferentes grupos étnicos.

O povo mwenekongo enviou nobres para estudar em Portugal. Com o passar dos anos, a influência dos portugueses entre os congoleses foi se consolidando, principalmente no declínio do Reino do Kôngo, no século XVII.

A percepção do cristianismo, por parte dos congoleses, ocorreu de tal forma que os africanos preservavam perspectivas e aspectos de sua matriz religiosa.

A religião cristã foi aderida pela elite congolesa, e com maior resistência pelo restante da população. Entretanto, ocorreu um processo de reinterpretação dos ritos religiosos cristãos pelos congoleses.

A exploração econômica portuguesa foi se intensificando, e, no ano de 1513, cerca de 400 congoleses foram escravizados e saíram de suas terras. A segunda metade do século XVI ficou marcada pela escravização de pessoas do Reino do Kôngo e da Angola para trabalharem em atividades agrícolas no Brasil.

O Reino do Kôngo enfrentou uma dura crise entre os anos 1568 e 1641, diante da invasão de inimigos e da fragilidade do poder desempenhado pelo rei por conta da influência portuguesa. Após esse período, houve alguns anos em que o monarca congolês conseguiu resistir aos portugueses.

O declínio do reino se intensificou política e economicamente no século XVII, com a redução de sua população ocasionada pela escravização. Mais tarde, nos anos de 1884 e 1885, com a Conferência de Berlim, o território foi repartido entre Portugal, Bélgica e França.

Com a chegada dos congoleses ao Brasil, suas práticas culturais e religiosas foram recriadas e vivenciadas por aqui. A partir daí, a congada começa a ser compartilhada, realizada e repercutida nas terras brasileiras em um processo de ressignificação de aspectos culturais africanos.

Senhor Prego à frente de uma bandeira com as imagens de Nossa Senhora do Rosário e de Anastácia.
O mestre congadeiro Senhor Prego à frente de uma bandeira com as imagens de Nossa Senhora do Rosário e de Anastácia, uma mulher escravizada. [3]

Os primeiros registros históricos da congada no Brasil ocorreram entre os anos 1711 e 1760. Os estados em que a manifestação mais se popularizou foram Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás e São Paulo.

Nesse período, os negros escravizados não podiam entrar nas igrejas, e por isso realizavam celebrações a seus orixás. Com a influência do catolicismo, eles começaram a cultuar santidades católicas, como a Nossa Senhora do Rosário, uma santa negra. Nesse processo, os santos católicos receberam nomes relacionados à religião de origem, como: Oxum Nossa Senhora da Conceição, Oxóssi São Sebastião e Ogum São Jorge.

Créditos de imagem

[1] Angela_Macario / Shutterstock

[2] Érica Catarina Pontes / Shutterstock

[3] Wikimedia Commons (reprodução)

Por: Lucas Afonso

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