Padre Cícero e a Revolução Cearense

O padre Cícero teve destacada participação na Revolução Cearense de 1914
O padre Cícero teve destacada participação na Revolução Cearense de 1914

A Revolução Cearense de 1914 se inseriu no contexto da política salvacionista do presidente Hermes da Fonseca (1910-1914) e também do domínio coronelista no interior do Brasil. Nesse conflito, somou-se ainda a utilização da crença religiosa, através do padre Cícero, como motivação para a adesão popular a um dos lados da peleja.

Hermes da Fonseca foi eleito em 1910, em um momento em que a política do café com leite estava em crise, já que os políticos dos estados de São Paulo e Minas Gerais não haviam chegado a um consenso sobre qual candidato indicar à eleição. Hermes conseguiu ainda o apoio de Pinheiro Machado, senador gaúcho que formou uma sólida aliança no Congresso Nacional entre os grupos estaduais marginalizados por mineiros e paulistas. Essa aliança teve influência política em alguns estados da federação, como no caso do Ceará.

Durante as eleições para governador do estado em 1912, formou-se um consenso da oposição em torno do nome do coronel do exército Franco Rabelo. Sua candidatura tinha forte apoio de alguns setores populares, principalmente na capital Fortaleza. Mas o representante do coronelismo regional e membro de uma influente família cearense, Nogueira Acioli, era apoiado pela situação e desencadeou uma violenta repressão aos adeptos de Rabelo, inclusive com várias mortes. Com o aparato repressivo que detinha e os mecanismos do coronelismo, principalmente no interior do estado, Acioli foi eleito governador.

Porém, Hermes da Fonseca havia iniciado uma campanha de enfrentamento aos coronelismos regionais, através da Política das Salvações, que consistia na intervenção do governo federal nos poderes estaduais, com a substituição de alguns grupos oligárquicos por outros. Nesse momento, o senador Pinheiro Machado estava em oposição a Hermes da Fonseca, e o conflito no Ceará também repercutiu essa oposição, já que Nogueira Acioli era um pinheirista.

A existência de certa pressão popular na capital, com o apoio das tropas federais, levou Nogueira Acioli a renunciar ao cargo de governador, passando a ocupá-lo o coronel Rabelo.

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Os grupos políticos ligados à família Acioli não aceitaram essa intervenção e articularam uma resposta ao novo governo. A iniciativa partiu do deputado Floro Bartolomeu, que buscou o apoio do padre Cícero Romão Batista, que havia sido destituído do cargo de prefeito da cidade de Juazeiro por Franco Rabelo. A influência de padre Cícero sobre vastas camadas populares do interior do Ceará, principalmente por verem no clérigo um milagreiro, foi utilizada para criar uma base de oposição ao novo governador.

Em seus sermões, padre Cícero conclamava as pessoas a aderirem à revolta contra o coronel Rabelo e ao governo federal. Em dezembro de 1913, os revoltosos tomaram a cidade de Juazeiro, no sertão do Cariri, e construíram uma vala de nove quilômetros em torno da cidade. Ficaram amotinados até janeiro de 1914, quando as tropas do governo estadual chegaram à região de Juazeiro. Tinha início a Revolução Cearense, ou a Revolta de Juazeiro. Abençoados por padre Cícero, os grupos revoltosos se dirigiram à capital Fortaleza, dominando ainda várias cidades do interior, realizando saques com o objetivo de conseguirem armas e alimentos. A liderança desses revoltosos cabia tanto ao padre Cícero quanto aos demais coronéis do interior do estado que não aceitavam o governo de Franco Rabelo.

Em março de 1914, conseguiram chegar a Fortaleza, tomando a cidade. Com a incapacidade de deter as tropas revoltosas, o coronel Franco Rabelo foi retirado do cargo, voltando ao poder Nogueira Acioli. Padre Cícero também retomou o posto de prefeito de Juazeiro.

O evento ocorrido no Ceará retratou de certa forma as divergências que existiam entre as oligarquias rurais do Brasil. Mostrou também como padre Cícero utilizou sua figura religiosa a favor dos interesses de poder de algumas famílias poderosas do Ceará. Era a utilização dos sentimentos religiosos populares a favor da manutenção do coronelismo.

Por: Tales Pinto

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