Revolta de Manoel Congo em Paty dos Alferes

Ocorrida durante o surgimento da cafeicultura no Vale do Paraíba, a Revolta de Manoel Congo resultou em fugas em massa de escravos e na efêmera constituição de um quilombo.

Capa do livro O Quilombo de Manoel Congo, publicado em 1935.
Capa do livro O Quilombo de Manoel Congo, publicado em 1935.

 E Camilo sapateiro,

O escravo apaixonado

Quando ia pra fazenda

Visitar seu amor dado

Pelo cruel capataz

Foi brutal assassinado.

Sentiu, então, Manoel Congo

Muita gota a se somar

Sendo essa a gota d’água

Que chegou a transbordar

O delito rude, insano,

Levou o escravo africano

Com isso, a se rebelar.

O trecho acima é do cordel O Quilombo Manoel Congo, a saga de um guerreiro, de Medeiros Braga. Nele é possível perceber os motivos que levaram os escravos das fazendas do capitão-mor Francisco Manuel Xavier, na freguesia de Paty dos Alferes, município de Vassouras, província do Rio de Janeiro, a realizarem a ação conhecida como Revolta de Manoel Congo, ocorrida em 1838. Os castigos e maus-tratos, além da morte de alguns escravos, pareciam ser uma constante nas fazendas do capitão-mor. O assassinato do escravo Camilo Sapateiro foi o estopim para a eclosão da revolta.

A região de Paty dos Alferes estava em ascensão econômica com o crescimento da cafeicultura no Vale do Paraíba Fluminense. Milhares de escravos afluíam às fazendas da região para trabalhar na lavoura do produto de exportação que garantiria a sustentação econômica do Império brasileiro.

 Manoel Congo era um desses escravos. Seu nome provavelmente indicava a região do continente africano da qual era proveniente. A função de ferreiro exercida na fazenda do capitão-mor mostrava que tinha uma qualificação maior de trabalho, o que provavelmente garantia a ele condições menos piores de trabalho. Na mesma situação poderia estar Camilo Sapateiro.

A morte desse último levou os escravos a procurarem seu senhor para que tomasse providências contra o capataz. O capitão-mor Francisco Manuel Xavier afirmou positivamente que atenderia a reivindicação dos escravos. Mas não cumpriu com sua palavra. Diante da situação, os escravos resolveram matar o capataz e entre  os  dias  06  e  10  de  novembro  empreenderam  uma série  de fugas das fazendas de Francisco Manuel Xavier.

Não pare agora... Tem mais depois da publicidade ;)

Após a morte do capataz, cerca de duzentos escravos fugiram das fazendas do capitão-mor e refugiaram-se na floresta de Santa Catarina, região próxima às fazendas. Na fuga, os escravos saquearam as instalações da propriedade, levando instrumentos e ferramentas de trabalho, além de algumas armas.

Esses utensílios serviram para iniciar a constituição de um quilombo, que ficou conhecido como Quilombo Manoel Congo. Vários escravos das fazendas da região fugiram para o local. Mas a experiência durou poucos dias. Em 11 de novembro, uma força militar da Guarda Nacional foi chamada à região para cumprir uma de suas funções: a de capitão do mato. O líder da Guarda Nacional era Luís Alves de Lima e Silva, o futuro duque de Caxias, que seria mais tarde patrono do exército, títulos conseguidos muito em decorrência da repressão a diversas rebeliões populares que ocorreram durante o Império.

Os escravos não conseguiram resistir por muito tempo. Alguns foram mortos pelas tropas, outros tantos foram recapturados e devolvidos a seus donos. Cerca de 16 escravos foram levados a julgamento pela participação na Revolta de Manoel Congo. Foram sentenciados a 650 chibatadas, distribuídas ao longo dos dias para evitar a morte. Além disso, foram obrigados a utilizar gonzos de ferro nos pescoços durante três anos.

A mesma sentença não foi aplicada a Manoel Congo. Era necessário punir exemplarmente o líder da revolta para evitar que novas fugas em massa de escravos ocorressem, colocando em risco a ordem escravocrata. Manoel Congo foi condenado à morte por enforcamento, sem direito a ter seu corpo enterrado, fato ocorrido em 1839.

A Revolta de Manoel Congo e sua repressão inseriram-se em um contexto de forte instabilidade política do Império. Durante o Período Regencial, várias rebeliões e revoltas eclodiram em território nacional, colocando em perigo sua unidade. Além da Revolta de Manoel Congo, a Balaiada e a Cabanagem, no norte do Império, também tiveram um caráter popular e, por isso, foram duramente reprimidas pelas forças militares controladas pela elite latifundiária. 

  

Por: Tales Pinto